segunda-feira, 7 de julho de 2008

HISTÓRIAS DA MINHA ALDEIA (7): A ESTRELA DE 5 PONTAS


(A ESCOLA DA LAMEIRA DE SÃO PEDRO)


Já falei aqui, em anteriores apontamentos, daquela que foi a minha escola primária, na Lameira de São Pedro, que dista cerca de cinco quilómetros da minha aldeia Barrô, assim chamada pelas grandes jazidas de barro de grande qualidade que deram origem a duas grandes fábricas de telha e tijolo –hoje extintas-, a norte da povoação, muito próximo de Vila Nova de Monsarros.
Frequentei aquela escola de 1962 a 1965. Nesse tempo, já o escrevi anteriormente, as classes masculina e feminina estavam divididas em duas salas distintas. Até há dias pensei que esta escola tinha sido mandada edificar por Salazar, e dentro do âmbito da política do ministério da instrução do Estado Novo (1933-1974). Mas não! Não foi Salazar que, preocupado com o grau de iliteracia do concelho da Mealhada, criou aquele estabelecimento de ensino. E quem foi? Pergunta você leitor. Tenha paciência, primeiro vou contar a história que considero uma curiosidade. Posso adiantar-lhe que a “assinatura” do benemérito está na estrela de cinco pontas que se encontra no frontispício, por cima das quatro colunas neoclássicas, e atrás da bandeira nacional.
O que considero uma lacuna grave é a escola não possuir nenhuma placa identificadora do seu fundador. Se possui, estará fora de vistas. Pelo menos eu, quer enquanto frequentei o ensino, quer depois, nunca ouvi falar no grande benemérito da instrução cujo selo de identidade era…a estrela de cinco pontas deixada no frontão do edifício. Embora desconheça quantas, mas sei que há várias escolas distribuídas pelo país com esta sigla.
Lembro-me que, no início dos anos 60, como a pobreza na freguesia de Luso era uma maleita imensa, nomeadamente a alimentação, foi construída uma grande e moderna cantina para os alunos poderem alimentarem-se com pelo menos uma boa refeição, neste caso, o almoço. O grande benemérito desta cantina foi Alexandre de Almeida, há época o proprietário dos hotéis, Palace do Bussaco e do Palace da Cúria. Retenho na memória de, pelo menos de uma vez, a escola ter sido visitada por este grande empresário hoteleiro e de todos os alunos estarem perfilados na cantina enquanto decorreu a visita do homem que estava a financiar aquele refeitório, Alexandre de Almeida.
Agora, acerca do benemérito da escola pública da Lameira, eu nunca ouvi nada, pelo menos até há dias. Em conversa com o meu amigo Filipe Rebelo, Juiz jubilado, homem de extensa cultura, perscrutador de silêncios de bibliotecas e estudioso do saber de alfarrábios de antanho, acerca do castelo de Barrô, atira-me, então, de supetão: “olhe que a escola da Lameira de São Pedro é da responsabilidade da mesma pessoa, ou seja, Francisco Grandella”. Mais tarde, a consubstanciar a informação, mostrou-me a primeira edição da “Cidade e os Campos”, ano um, em que realmente aquela publicação, da responsabilidade do dono dos Grandes Armazéns do Chiado, referia, através de foto, que todas as escolas criadas através da benemerência daquele grande comerciante detêm a estrela de cinco pontas no frontão do edifício.
Mais tarde, em conversa com a pessoa mais idosa de Barrô, e talvez da freguesia de Luso, a senhora Lucília Dias –fará um século de vida no dia 19 de Setembro de 2008-, segundo esta adorável centenária senhora, esta escola foi mandada construir pelo grande comerciante Lisboeta para, mais uma vez, agradar ao seu grande amor clandestino, a sua criada Aurora. Ao que parece, a eleita do coração de Grandella, que era de Barrô, tinha uma sobrinha que andava a estudar. Os planos do abastado comerciante e da “sua” Aurora para esta familiar era que ela, um dia, seria professora. Juntando o útil ao agradável, como quem diz, desenvolver o ensino na freguesia e ao mesmo tempo, mais tarde, aquele lugar seria ocupado pela sobrinha da sua amante. A escola construiu-se, mas a “tal” sobrinha de Aurora nunca chegou a concluir o magistério.
Ainda segundo informações avisadas de um conterrâneo, Alcides Vital, residente no Buçaco, refere-me o livro “O Concelho da Mealhada”, de Adelino de Melo, editado em 1919, sobre a Instrução Pública, e cita uma passagem: “Além das estatísticas, faz parte do número das 16 escolas, uma mista, aberta na Lameira de São Pedro, freguesia de Luzo, em 1918, cujo edifício foi oferecido à Câmara Municipal deste concelho pelo industrial lisbonense sr. Francisco Grandella, que tem à vista da escola, na povoação de Barrô, um elegante chalet. Insima-o a seguinte legenda: VII Escola –Fundada pelos Armazéns Grandella- sempre por bom caminho a seguir. Emídio Navarro MCMXV”.
Complementa, ainda, gentilmente, Alcides Vital Rego, que Francisco Grandella era maçon, e daí a razão da estrela de 5 pontas no edifício. Foi um dos fundadores da Sociedade dos Makavenkos, que integrava outras personalidades maçónicas como Rafael Bordalo Pinheiro.
Parece que nos começos do século XX era costume Grandella vir a “banhos” para as termas de Luso, águas abençoadas para várias terapias físicas e descanso mental. Então, para além do seu amor subversivo e ilegítimo ser natural de Barrô, como também gostava muito desta zona, mandou construir o castelo e a escola.
Foi assim, segundo Lucília Dias, que, em honra de uma paixão, nasce a escola da Lameira de São Pedro e o Castelo de Barrô sob os auspícios do grande homem, negociante e também preocupado com o grau de ensino do povo. Tudo indica que uma bela dama esteve por detrás destes gestos altruístas. O que um coração apaixonado não faz?

11 comentários:

Anónimo disse...

Boa noite.
Apenas hoje, descobri este espaço tão interessante e aproveito para apresentar os meus parabéns.
Sobre os símbolos da escola, não terão a ver com a maçonaria?
Não pretencia o Sr. Francisco Grandela à Maçonaria?

LUIS FERNANDES disse...

Quase de certeza. Muito obrigado pelo seu alvitre. Volte sempre. A porta está sempre escancarada para si e para os seus amigos.
Um abraço.
Luis Fernandes

Alcides Rego disse...

Peço desculpa, por lapso, o comentário de ontem seguiu como anónimo.
Tenho ideia de ter lido algo sobre o Castelo de Barrô nos escritos de Adelino de Melo da Vacariça, ou num outro livro ou monografia. Vou procurar nos meus arquivos e se encontrar alguma informação adicional, envio.
Cumprimentos.
Alcides Rego

André Melo disse...

Caro Alcides:

Fico muito agradecido pela sua colaboração que espero que tenha continuidade!
Um abraço

LUIS FERNANDES disse...

Muito obrigado por ter comentado. Se gostou continue. Nesta humilde casinha há sempre um sorriso para quem entra.
Aproveito para lhe pedir que me informe o nome do livro, e do autor, acerca do castelo de Barrô. É que, sinceramente, embora seja de lá, para além de desconhecer a sua história, não sabia que havia dados biográficos escritos, e, para mim, é enriquecedor.
Um abraço e obrigado.
Luis Fernandes

Alcides Rego disse...

Finalmente encontrei o que havia lido há cerca de vinte anos atrás, em cópia do livro "Concelho da Mealhada" de Adelino de Melo, editado em 1919, sobre a Instrução pública:
"Além desta estatística, faz parte do n.º das 16 escolas, uma mista, aberta na Lameira de S. Pedro, freguesia de Luzo, em 1918, cujo edifício foi oferecido á Camara Municipal deste concelho pelo industrial lisbonense sr. Francisco Grandela, que têm á vista da escola, na povoação de Barrô, um elegante chalet. Insima-o a seguinte legenda: -VII Escola- Fundada pelos Armazens Grandela - Sempre por bom caminho a seguir. - Emídio Navarro - MCMXV."

Sobre a Maçonaria, pelo que li na net, Francisco Grandella, era maçon. Ele próprio foi um dos fundadores da Sociedade dos Makavenkos que integrava outras personalidades maçónicas como Rafael Bordalo Pinheiro.

LUIS FERNANDES disse...

Muito interessante estes seus dados monográficos. Muito obrigado. Vou acrescentá-los nas minhas histórias. Se não se importar bostava de citar o seu nome.
Se acaso estiver de acordo, diga-me se Alcides Vital é mesmo seu nome e de onde é. Pode ser?
Aguardo a sua resposta.
Um abraço e mais uma vez muito obrigado.
Luis Fernandes

LUIS FERNANDES disse...

Há coisas do arco da velha. Veja bem como a alteração de uma única letra tem um efeito devastador no texto. Já depois de ter postado o comentário reparei que em vez de ter escrito "Gostava", escrevi "Bostava". As minhas desculpas, não tenha dúvidas de que foi mesmo uma infeliz troca de letras.
Um abraço.
Luis Fernandes

LUIS FERNANDES disse...

Lembrei-me também agora, já depois de ter inserido a resposta, que pode não querer tornar pública as suas reminiscências. Nesse caso, se assim for, responda-me para: choupalapa@sapo.pt
Um abraço.
Luis Fernandes

Alcides Rego disse...

Alcides Vital é mesmo o meu nome e não um nick, mais conhecido por Alcides Rego. Apesar de ser natural de Canelas - Estarreja, resido em Almas do Encarnadouro - Buçaco.
Já enviei mail a completar a informação.
Um abraço.

LUIS FERNANDES disse...

Recebi e respondi também por mail.
Muito obrigado amigo Alcides.
Um abraço.
Luis fernandes